terça-feira, 17 de junho de 2014

Empresa high-tech evita Bolsa de Valores

Por QUENTIN HARDY
A Palantir Technologies tem um trabalho profundamente complexo e sigiloso e é uma das mais valiosas empresas privadas de tecnologia do Vale do Silício.
Fundada em 2004, em parte com US$ 2 milhões da Agência Central de Inteligência (CIA), a Palantir criou um software que já descobriu redes terroristas e mapeou rotas de trânsito seguras em uma Bagdá devastada pela guerra. Também rastreou ladrões de carros e ajudou na recuperação de desastres. Seu software foi usado no JPMorgan Chase para deter as fraudes cibernéticas e na Hershey para aumentar os lucros do chocolate.
A tecnologia é complexa, mas a premissa é simples: o software consome enormes quantidades de dados -desde o volume das chuvas locais a transações bancárias- e tira conclusões com base nessas combinações improváveis. Onde há probabilidade de ocorrer um atentado terrorista? Qual é uma má aposta financeira?
Neste ano, a Palantir, baseada em Palo Alto, Califórnia, deverá faturar cerca de US$ 1 bilhão, na maior parte de companhias privadas interessadas em adaptações de seu software de inteligência. Embora ela ainda não seja rentável, os investidores deram à empresa quase US$ 900 milhões ao todo. A rodada mais recente, em dezembro passado, vendeu ações da Palantir para investidores com uma avaliação implícita da empresa em US$ 9 bilhões.
Tudo isso fez seus investidores, que incluem alguns dos fundos de investimento mais bem-sucedidos do mundo, aguardarem ansiosamente por uma oferta pública inicial (IPO, na sigla em inglês).
Mas Alex Karp, 46, cofundador e executivo-chefe da Palantir, que tem doutorado em filosofia e uma visão idealista da empresa, diz que está resistindo à grande riqueza. Ele teme que o dinheiro -e a ênfase no preço da ação- destrua a missão da Palantir: usar seu software para melhorar o mundo. Uma IPO "é corrosiva para nossa cultura, corrosiva para nossos resultados", disse ele.
"Quando você está salvando o mundo, combatendo fraudes e o trabalho escravo, você pode fazer grandes coisas", disse Karp, que possui cerca de 10% da empresa.
A companhia não cobra pela maior parte de seu trabalho humanitário, o que é uma fonte de orgulho interno. Ela cresce com a venda de software para empresas privadas.
No início, a Palantir, com algumas centenas de funcionários, tinha uma cultura interna de discussão de temas. Mas hoje a companhia é muito maior (1.500 empregados), o que torna mais difícil estabelecer um consenso. Deveria ela continuar trabalhando com o governo britânico, apesar de suas duras leis de imprensa? Os contratos continuam.
Alguns empregados não querem que a Palantir ajude Israel porque discordam de suas políticas para os palestinos. Ainda há contratos com os israelenses. A Palantir não trabalha com a China.
Peter Thiel, investidor do Vale do Silício e orgulhoso libertário, pensou a Palantir em 2003, um ano depois de ter vendido o PayPal para o eBay. Ele contratou Karp, um amigo da faculdade, assim como veteranos do PayPal. A Palantir começou com uma ideia do PayPal. A certa altura, o PayPal estava perdendo o equivalente a 150% de sua receita para cartões de crédito roubados. Então descobriu como os computadores poderiam identificar atividades suspeitas em escala global.
Os fundadores da Palantir pensaram que a mesma abordagem funcionaria para a segurança nacional. A CIA deu aos fundadores introduções a outros esquemas de espionagem.
Para criar uma empresa no setor privado, Thiel chamou Michael Ovitz, ex-diretor dos Estúdios Disney, que pensou que a Palantir poderia ser usada para vender anúncios on-line. Mas a crise na habitação mudou seu modo de pensar. Os bancos tinham milhares de casas em arresto em todos os Estados Unidos, e não sabiam como limpar o estoque em um mercado em colapso.
"A ideia era escolher um banco, e o resto viria atrás", disse Ovitz. O JPMorgan foi o primeiro. Assim como a Palantir descobriu como circular por Bagdá analisando ataques à beira da estrada e imagens de satélite, ela deduziu os preços de venda das casas examinando matrículas nas escolas, tendências de emprego e vendas no varejo. Dados que o JPMorgan pensou que levaria anos para integrar foram postos em ação em poucos dias.
O JPMorgan ainda usa a empresa para cibersegurança, detecção de fraudes e outros trabalhos, carregando 0,5 terabyte de dados no sistema da Palantir a cada dia, segundo um vídeo da companhia. Um porta-voz do JPMorgan não quis comentar projetos específicos. Jim Rosenthal, do Morgan Stanley, outro cliente da Palantir, disse: "Nenhum ser humano pode olhar todas as fontes de dados ao mesmo tempo".
Clientes do governo também lutam com a explosão de dados. Preet Bharara, procurador dos Estados Unidos em Nova York que usou a Palantir, disse: "Tudo se torna mais difícil quanto mais o crime se globaliza, há mais atores envolvidos, mais corretoras ao redor do mundo". NYT, 17.06.2014

Gigantes da internet erguem barreiras contra espionagem

Empresas tentam reconquistar confiança perdida
Por DAVID E. SANGER e NICOLE PERLROTH
MOUNTAIN VIEW, Califórnia - Engenheiros do Google trabalham no que se tornou a nova corrida armamentista da tecnologia moderna: dificultar ainda mais a invasão de seu sistema pela Agência de Segurança Nacional (NSA) e por serviços de inteligência.
O Google está vedando o quanto antes as rachaduras que foram reveladas por Edward Snowden e que a NSA explorou. A empresa está criptografando mais dados enquanto transfere servidores e ajuda clientes a codificarem seus e-mails. Facebook, Microsoft e Yahoo estão dando passos semelhantes.
Depois de anos de cooperação com o governo, o objetivo é deter Washington - bem como Pequim e Moscou. A estratégia também busca manter os negócios no exterior, em países como Brasil e Alemanha, que ameaçaram confiar dados apenas a provedores locais.
O Google, por exemplo, está instalando seus próprios cabos de fibra óptica sob os oceanos, projeto que começou como um esforço para cortar custos, mas que agora tem um propósito a mais: garantir que a empresa terá mais controle sobre o tráfego de dados de seus clientes.
Um ano depois das revelações de Snowden, a era da cooperação silenciosa chegou ao fim. Operadoras de telecomunicações dizem que estão recusando pedidos para fornecer dados que não estejam previstos pela lei.
Mas os governos estão contra-atacando. A gigante de telefonia móvel Vodafone informou no começo do mês que um "reduzido número" de governos em várias partes do mundo exigiu meios para acessar diretamente suas redes de comunicação, um nível de vigilância que provocou indignação entre defensores da privacidade.
A Vodafone recusou-se a identificar os países por receio de colocar seus negócios e funcionários em risco nesses lugares. Mas a empresa revelou que alguns países diziam que "agências relevantes e autoridades" locais tinham "acesso permanente às comunicações dos clientes" da Vodafone "por meio de seu próprio link direto".
A empresa também disse que teve que ceder a algumas solicitações feitas por governos em obediência às leis nacionais. De outra forma, disse, poderia perder sua licença para operar em certos países.
Eric Grosse, diretor de segurança do Google, disse que o próprio comportamento da NSA provocou esse momento. "Estou disposto a ajudar puramente pelo lado defensivo da coisa", disse em referência aos esforços de Washington para alistar o Vale do Silício em esforços de cibersegurança. Em Washington, autoridades reconhecem que agora é muito mais difícil executar programas secretos, porque empresas norte-americanas de tecnologia, por receio de perder clientes internacionais, estão reforçando suas redes e negando pedidos que antes aceitavam em silêncio.
Robert Litt, conselheiro-geral do Departamento de Inteligência Nacional, que supervisiona todas as 17 agências de espionagem norte-americanas, disse que é "um prejuízo inquestionável para a nação que as empresas estejam perdendo a vontade de cooperar legalmente e voluntariamente" com os serviços de inteligência dos EUA.
Ele disse que "cedo ou tarde haverá alguma falha de inteligência e as pessoas vão se perguntar por que as agências de inteligência não foram capazes de proteger a nação".
As empresas dizem que, se isso acontecer, é culpa do próprio governo e que as agências de inteligência, em sua busca por uma ampla coleta de dados, minaram a segurança da rede para todos.
Muitos destacam um episódio em 2012, quando pesquisadores de segurança russos descobriram uma ferramenta de espionagem do governo, chamada Flame, em computadores iranianos. Acredita-se que o sistema Flame, que aproveita uma falha nos sistema operacionais da Microsoft, foi produzido, pelo menos em parte, por agências de inteligência dos EUA. As companhias argumentam que outros podem ter se aproveitado desse defeito.
Temerosa de que tal fato diminua a confiança em seus sistemas, a Microsoft irá até o final do ano "lacrar" todos os seus produtos, incluindo o Hotmail e o Outlook.com, com uma criptografia de 2.048 bits, proteção mais forte e bem mais difícil de ser derrubada.
Bradford Smith, conselheiro-geral da Microsoft, disse que o grupo está instalando "centros de transparência" no exterior para que especialistas técnicos de governos estrangeiros possam inspecionar o código-fonte da companhia. Isso permitirá que governos estrangeiros tenham a certeza de que não existem "portas dos fundos" que permitiriam a bisbilhotagem por agências de inteligência dos EUA. O primeiro centro desse tipo está sendo instalado em Bruxelas.
Empresas de hardware como a Cisco, que fabrica roteadores e computadores, viram seus produtos como tema frequente das revelações de Snowden, e seus negócios caíram de forma constante em regiões como Ásia, Brasil e Europa no último ano.
A empresa ainda está com dificuldades para convencer clientes estrangeiros de que suas redes estão protegidas dos hackers - e livre de "portas dos fundos" instaladas pela NSA. O frustrante, dizem as companhias, é que é praticamente impossível provar que seus sistemas não seriam invadidos pela NSA.
Até o ano passado, as empresas de tecnologia eram proibidas de identificar as solicitações de dados feitas pelo governo dos Estados Unidos, conforme prevê a Lei de Vigilância de Inteligência Estrangeira. Mas, em janeiro, Google, Facebook, Yahoo e Microsoft fecharam um acordo com a administração Obama para divulgar o número desse tipo de solicitações em grupos de mil.Como parte do acordo, as companhias concordaram em arquivar seus processos no Tribunal de Vigilância de Inteligência Estrangeira.
"Não estamos correndo para nos esconder", disse Joe Sullivan, diretor de segurança do Facebook.
"Acreditamos que o processo precise ser transparente para que as pessoas possam avaliar os meios apropriados para lidar com esse tipo de coisa."Colaboraram Steve Lohr e Mark Scott. NYT, 17.06.2014.