quinta-feira, 29 de maio de 2014

Para Snowden, vazamento sobre governo dos EUA foi 'necessário'

Ex-técnico da NSA deu sua primeira entrevista à TV americana
ISABEL FLECKDE NOVA YORK
Em sua primeira entrevista à TV americana desde que revelou o amplo esquema de espionagem do governo americano, o ex-técnico da NSA (Agência de Segurança Nacional dos EUA) Edward Snowden disse se considerar "um patriota" e afirmou que as ações da inteligência americana o obrigaram a vazar os documentos sigilosos.
"A Constituição dos EUA foi violada em uma enorme escala. Se isso não tivesse ocorrido, se o governo não tivesse ido tão longe, não estaríamos numa situação em que o vazamento fosse necessário", disse Snowden ao programa "Nightly News", da rede NBC nesta quarta (28).
A entrevista foi gravada na semana passada, na Rússia, país que lhe concedeu asilo político em agosto de 2013. Na entrevista, contudo, Snowden diz que não escolheu a Rússia como destino final, que tinha passagem comprada para Cuba e que sua intenção era ficar na "América Latina".
"Eu fui parado porque os EUA revogaram meu passaporte e me colocaram uma armadilha no aeroporto de Moscou", disse. "Não tenho nenhuma relação com a Rússia, nunca encontrei o presidente russo, não sou apoiado pelo governo russo."
Ele assegura, inclusive, que destruiu todo o material de inteligência que estava com ele antes de sair de Hong Kong rumo a Moscou ""e que, portanto, não teria o que repassar ao governo russo.
"Se eu pudesse escolher qualquer lugar para ir agora, o primeiro seria a minha casa", disse.
Folha, 29.05.2014.

terça-feira, 20 de maio de 2014

EUA acusam China de espionagem industrial: Cinco pessoas trabalhariam numa unidade especial do Exército e teriam hackeado empresas americanas

Denúncia é 'absurda', diz Pequim; chineses lembram revelações de Snowden: 'é ladrão gritando pega-ladrão'
RAUL JUSTE LORESDE WASHINGTON
O governo dos EUA anunciou nesta segunda-feira (19) a abertura de uma ação criminal contra cinco militares chineses, acusados de espionagem industrial e invasão de computadores de grandes empresas americanas.
O secretário de Justiça, Eric Holder, anunciou o processo dizendo que o indiciamento é a "primeira acusação contra membros do Estado chinês por infiltrar alvos comerciais americanos por meios tecnológicos".
"Temos que dar um basta. O governo não vai tolerar atos de nenhum país que procure sabotar empresas americanas e minar a integridade da livre concorrência", disse Holder em entrevista coletiva.
As acusações se referem a seis casos envolvendo grandes empresas americanas, como Westinghouse, Alcoa e US Steel --indústrias dos setores de energia nuclear, solar e de mineração.
Se julgados, os chineses podem sofrer sentenças de dois a 15 anos de prisão --algo hipotético, porém, dado que dependeria de extradição pelo governo chinês aos EUA, o que é bastante improvável.
Os cinco militares chineses, segundo a investigação do governo americano, são membros de uma unidade especial 61938 do Exército Popular de Libertação.
Sediada em Xangai, a instalação foi descoberta no ano passado como especial por empresas privadas de segurança cibernética como uma das centrais de espionagem industrial da China.
EFEITO SNOWDEN
No ano passado, o presidente Barack Obama falou publicamente sobre a espionagem industrial chinesa, tema que dominou seu primeiro encontro com o colega chinês, Xi Jinping, em junho.
Dias antes, entretanto, estourou o escândalo da espionagem da NSA (Agência de Segurança Nacional dos EUA), revelada pelo ex-técnico Edward Snowden, o que fez com que as autoridades americanas deixassem a controvérsia com a China de lado, ao menos publicamente.
Durante o período das denúncias de Snowden, o governo americano repetiu algumas vezes que seu foco era "segurança", não "espionagem industrial".
RESPOSTA CHINESA
Em resposta postada no site do Ministério das Relações Exteriores da China, o porta-voz Qin Gang disse que as acusações são "absurdas" e "sem fundamento".
Qin pediu ao governo americano que retire o processo imediatamente e acrescentou que o governo chinês estava suspendendo a participação chinesa em uma comissão bilateral sobre internet.
"Estão fabricando fatos e usando desculpas para nos acusar de roubar segredos".
Nas redes sociais chinesas, internautas chamaram os hackers de "heróis" e disseram que se tratava de "um ladrão gritando pega-ladrão".
Muitos também lembraram que, nas acusações feitas por Snowden, a NSA teria espionado a gigante empresa de telecomunicações Huawei. Folha, 20.05.2014
www.abraao.com

segunda-feira, 19 de maio de 2014

Tira meu nome daí: Europa consagra 'direito ao esquecimento' e retira conteúdo do Google; no Brasil, decisões vão no mesmo caminho

DE SÃO PAULO
Um usuário procura o próprio nome no Google. Aparecem blogs, seus perfis, o registro de uma dívida antiga e vários outros sites. Se conseguir provar que uma das páginas tem conteúdo "inadequado, irrelevante ou não mais relevante", ele pode requisitar a retirada do link.
Essa situação é possível na União Europeia desde o dia 13, quando seu mais alto tribunal consagrou o "direito ao esquecimento" na web.
O assunto está em debate desde 2012, quando o parlamento do bloco incluiu o conceito em artigo do projeto da Lei de Proteção de Dados Pessoais --que não entrou em vigor e ainda não tem data.
O surgimento da ideia de "direito ao esquecimento" tem raízes na França e não está ligado ao mundo on-line. No país, a lei garante que um criminoso condenado, após cumprir pena --e, em teoria, se reabilitar--, oponha-se à publicação de fatos relacionados ao crime que cometeu.
No lado oposto do debate, contrário à prerrogativa, estão os Estados Unidos. O argumento para defender a posição é igualmente forte: pessoas mal intencionadas, como políticos corruptos, podem solicitar retirada de conteúdo com fins de censura.
A interpretação americana é de que as liberdades de expressão e de imprensa --garantidas, lá, pela Primeira Emenda à Constituição-- se sobrepõem ao desejo de o usuário retirar informações.
"Com frequência pedem para remover todas as referências a Fulano'", escreve Peter Fleischer, conselheiro de privacidade do Google, em seu blog. "Nenhuma lei pode ou deveria prover tal direito."
NO BRASIL
Juristas especializados em direito digital no país não chegaram a consenso sobre qual interpretação é melhor. O assunto foi debatido no CJF (Conselho da Justiça Federal), e juízes brasileiros já determinaram retirada de conteúdo com base no conceito.
Os dois julgamentos mais notórios, ambos no STJ (Superior Tribunal de Justiça), dizem respeito a vítimas de crimes antigos que venceram processos contra veículos de imprensa, por reportagens que relembravam os casos.
Apesar do precedente, o "direito ao esquecimento" que vigora no país não tem os mesmos moldes que na Europa. Questionado pela Folha, o Google afirmou que, até agora, a decisão europeia não teve influência na quantidade de pedidos de remoção de conteúdo no Brasil.
"Não se trata de apagar informações, mas de como essas informações são utilizadas. Se foram usadas pra prejudicar pessoas, vamos ter que dar um jeito de aplicar o direito ao esquecimento'", defende o advogado Renato Opice Blum, sócio do escritório que leva seu sobrenome.
Já o advogado Leandro Bissoli, sócio do PPP Advogados, afirma que a Justiça deve ser procurada só se o usuário não chegar a acordo com o site. "A pessoa que se sentir incomodada pode procurar mecanismos do próprio Google para denunciar violação."
"O direito ao esquecimento', sob o prisma da liberdade de expressão, é mais veneno do que remédio", escreve Ronaldo Lemos, advogado e colunista da Folha.